Para sobreviver, negócios devem se adaptar aos novos padrões de comportamento
Conforme os painelistas, o simples investimento em tecnologia não representa a transformação e as empresas gaúchas ainda estão longe de atingir a maturidade digital
A revolução no comportamento do consumidor, provocada pelo avanço da tecnologia, desafia empresas e exige uma nova postura diante do mercado. Tema do terceiro workshop Negócios em Pauta de 2019, a transformação digital motivou mudanças drásticas no modelo mental das empresas de sucesso, ao mesmo tempo em que tornou obsoleto sistemas que foram bem sucedidos por décadas.
Realizado no salão de eventos da Acil, o painel reuniu especialistas do setor, sob mediação do analista de Sistemas e Marketing do Grupo A Hora, Marcelino Macedo. Participaram do debate o Gerente de TI da Univates, Paulo Mallmann, o presidente do Instituto da Transformação Digital (ITD), Paulo Kendzerski e o gestor de desenvolvimento da empresa Solis, Jamiel Spezia.
Mallmann iniciou o painel alertando para a urgência do tema. Segundo ele, as empresas hoje vivem as incerteza desse momento de transição e acabam realizando investimentos sem um diagnóstico adequado das necessidades.
“A transformação digital só acontece quando você entende os seus clientes e suas necessidades, fazendo um planejamento estratégico a partir desse entendimento”, aponta. Segundo ele, o conceito está muito além da tecnologia e da formação dos processos, que são apenas os meios pela qual a transformação digital é realizada.
Jamiel Spezia lembra que a Solis já nasce como uma empresa digital, ainda no ano 2000, com a proposta de trabalhar com serviços on-line em uma época em que a internet ainda era incipiente. Para ele, a transformação digital vem engatinhando desde então, a partir da informatização das empresas e a consequente geração de dados.
“Estamos em uma velocidade exponencial. A formação de dados dentro de uma empresa já existe e essas informações precisa ser úteis”, ressalta. A gestão dos processos digitais, aponta, permite o cruzamento das informações do negócio, que passam a basear todas as decisões das empresas.
Paulo Kendzerski afirma que o tema faz parte de um contexto de transformações que ocorrem a cada 20 anos nos negócios. Porém, lembra que a principal diferença contemporânea é justamente a origem da mudança.
“Em 2020, no grande pico da transformação digital, essa mudança não vem da indústria, e sim do consumidor, que está 24 horas por dia conectado”, destaca. Para Kendzerski a origem nas pessoas faz com que este movimento seja irreversível. Com isso, afirma, não teremos mais modelos de negócios como a 20 ou 30 anos atrás.
Elementos da transformação
Conforme Paulo Kendzerski os pilares que fazem parte desse novo momento do mercado são a experiencia do consumidor, a transformação dos processos e do modelo dos negócios. Cita como exemplo o caso do Uber, modelo de negócios que tornou os táxis obsoletos.
“Houve uma mudança na experiência do consumidor, pela facilidade de chamar o Uber pelo celular a qualquer momento. Isso está ocorrendo em todos os setores”, destaca. Segundo ele, o objetivo do Instituto da Transformação Digital é justamente o de promover iniciativas para as pessoas compreendam e possam se adaptar ao conceito.
Conforme Kendzerski, coisas pontuais como lançar um site, operar com e-commerce ou atender os clientes por meio de aplicativos não são suficientes para estabelecer essa mudança. Segundo ele, 70% das empresas hoteleiras possuem atendimento por Whatsapp, mas todas continuam operando o aplicativo entre as 9h e as 18h. “Usam a tecnologia, mas o pensamento continua analógico.”
A transformação digital ocorre, afirma, quando são utilizados mecanismos de inteligência artificial como os chatboots, capazes de atender os clientes durante as 24 horas do dia. “O consumidor quer uma resposta imediata.”
Conflito de Gerações
Para Kendzerski o momento atual é de drástica mudança de comportamento entre gerações Hoje, aponta, os jovens não querem mais consumir produtos e serviços, ou mesmo trabalhar, em horários pré-determinados e engessados.
“Minha neta assiste desenhos a hora que ela quiser e em qualquer dia da semana, enquanto para assistir uma novela preciso estar em casa na hora certa”, alega. Segundo ele, o jovem de hoje é 100% digital, por isso não tem interesse em cumprir horários dentro de uma empresa, por exemplo.
“Os gestores precisam pensar em daqui a cinco anos, ou para quando as minhas netas entrarem no mercado de trabalho”, acredita. Para Kendzerski, hoje as empresas perdem bons profissionais, em especial na área da economia criativa, por manter exigências que não fazem sentido para as novas gerações. Segundo ele, a tecnologia está disponível para todos, mas transformação digital de verdade precisa começar pela forma de pensar do líder e da gestão do RH das empresas.
As mudanças provocadas pela tecnologia e os novos comportamentos no modelo de educação foram abordadas por Paulo Mallmann. Segundo ele, a Univates percebeu a impaciência do aluno chegar às 19h15min uma sala de aula e se manter atento até às 22h15min. “Esse modelo da educação está com os dias contados.”
Diante disso, a universidade buscou compreender o comportamento dos alunos e as movimentações do mercado do setor e elaborou, entre outras medidas, a criação de cursos para o Ensino à Distância. “Assim, procuramos alcançar aquela fatia de estudantes que quer estudar quando e como quiser.”
A quem pertence os dados?
O presidente do ITD afirma que o Instituto nasceu para estudar o mercado e compreender em que estágio da transformação digital se encontram as empresas. Segundo ele, mesmo empresas que trabalham exclusivamente com tecnologia enfrentam dificuldade devido a forma analógica de pensar.
Cita como exemplo a falta de atenção para com os dados dos clientes. Segundo ele, as empresas fornecem o wifi para as pessoas, mas pedem check-in no facebook. Dessa forma, quem fica de posse dos dados do cliente é a rede social, e não a empresa que forneceu o sinal de wifi.
“Se eu entrar na loja com o celular no bolso e conectar no wifi, amanhã o google me oferece uma promoção em outra loja do mesmo setor”, alerta. Desta forma, complementa, as empresas entregam seus bancos de dados para o Google e para o Facebook por desconhecimento ou comodidade.
Conforme Kendzerski, mesmo quando os dados são lançados no site próprio da empresa, falta expertise para utilizar as ferramentas de inteligência digital. Lembra que empresas como Netshoes e Dafiti chegam a ter mais de 32 ferramentas de inteligência digital, enquanto no RS 70% do mercado usa uma única ferramenta: o Google Analitics.
“Mesmo assim, boa parte delas não designa um profissional acompanhar a ferramenta e entender o que ocorre dentro do site”, assinala. Dessa forma, para conseguir se comunicar com todos os seguidores do Facebook, por exemplo, as empresas precisam pagar.
“O modelo mental de negócio de todos os segmentos precisa mudar. Se eu parar de abastecer em um posto de gasolina, aquele posto não sabe quem eu sou”, aponta. Para ele, o problema das empresas é compreender que hoje existe muito mais gente acessando o site da empresa do que entrando em uma loja física.